domingo, 27 de maio de 2012

superação


Quando não somos capazes de ver para além do metro quadrado que transitoriamente ocupamos e quando a nossa intuição não nos projecta para além do tempo mais ou menos escasso em  que cada um  resiste á dinâmica do transitório, ficamos embrenhados num labirinto onde aquilo que parecia uma promissora saída nos introduz num ponto de partida do qual queríamos a todo o custo descolar.

Enfrentar o medo é uma tarefa difícil e que duma forma ou de outra  requer ousadia, risco de perda, superação da paralisia, desinstalação do nosso buraco e partida para o desconhecido. Pensar que estamos imunes ao medo é estultícia que só a mais profunda e por vezes inconsciente alienação pode suportar. Se tenho medo de enfrentar o futuro tento distrair-me com o esgotamento do presente, mas como o presente não é mais que um arroto, por vezes azedo, entre o antes e o depois, acabo por ir vivendo com um profundo , irritante e sintomático amargo de boca. Não consigo saborear a vida pois a confiança no futuro é o adoçante que ameniza o desconforto do presente.

Neste fim de semana em muitas localidades fazem-se festas em honra do Espírito Santo. Não somos capazes de definir Quem é o Espírito Santo, mas segundo os relatos que nos chegam a presença do Espírito Santo transformou o medo em ousadia, a ignorância em sabedoria, a perseguição em libertação, o acanhamento em desenvoltura e a desilusão em promessa de sucesso. É-nos referido que quando somos capazes de aceitar que Deus assume a nossa dimensão humana é Natal, que quando acreditamos que a dimensão humana é introduzida na dimensão divina é Páscoa e que quando nos deixamos conduzir  pela novidade que irradia dessa nova dimensão e que o presente não se esgota em si mesmo é  Pentecostes.

gratidão

Um dos sentimentos mais naturais, mas também mais dignificantes é sem dúvida o sentimento da gratidão. Quando alguém se cruza connosco e nos dá prioridade mesmo quando a não tinhamos, sentimo-nos gratos. Quando alguém nos acolhe sem nos repreender mesmo que tenha razão para tal, sentimo-nos gratos. Quando alguém nos estende a mão porque tropeçámos na pedra da calçada, sentimo-nos gratos. Quando alguém nos promove para além dos nossos méritos reais ou imaginados, sentimo-nos gratos. Quando alguém toma a iniciativa de nos ajudar a levar um fardo pesado, sentimo-nos gratos. Quando alguém nos distingue e não nos trata como um anónimo, sentimo-nos gratos. Quando alguém é nosso amigo, independentemente do tipo de relação que mantemos com ele, sentimo-nos gratos. Quando alguém se alegra com o nosso sucesso e sofre em silêncio com o nosso fracasso, sentimo-nos gratos.

A gratidão mantem-nos na rota do encontro com o outro e projecta-nos para fora de nós mesmos. Sentimos que não somos o centro do universo, mas que fazemos parte dum universo relacional onde o encontro é uma maneira de ser e de estar. Ninguém é só, niguém está só, ningém se realiza só, niguém quer viver só. Por isso a gratidão é uma forma superior de viver e de conviver.
Na passada quinta-feira a minha atenção reteve e ainda se não descolou, a informação transmitida pelo evangelista João no versículo 20º do capítulo 17 do seu evagelho: Jesus rezou por todos aqueles que ao longo da história iriam crer Nele. Como a sua relação é sempre uma relação pessoal e como a sua oração é a única eficaz, surgiu em mim um sentimento de gratidão que me acompanha e um sentimento de confiança que me anima.

domingo, 13 de maio de 2012

A Senhora da charneca

   
Neste dia 13 de Maio encontram-se reunidas numa antiga charneca, lá para os lados de Fátima, umas centenas de milhares de pessoas oriundas das mais diversas paragens. Umas querem ver, outras celebrar, mas todas se movimentam atraídas pela sua própria motivação. Esta concentração  a ocorrer no centro da nossa Lisboa faria esquecer qualquer outra manifestação das muitas a que vamos assistindo e que chamam muito justamente a nossa atenção para a diversidade dos problemas que questionam a nossa sociedade. Já não falo dos estádios da nossa cidade que se enchem para verem extasiados 22 rapazes, vigiados por uns inspectores chamados árbitros, a correr atrás duma bola para ver quem a consegue encaixar nuns espaços chamados balizas.

Mas o que aconteceu lá na charneca que atrai, como se dum íman se trate, tanta gente que se entusiasma por chegar, se alegra com o estar e depois recorda com saudade a experiência de ter pisado aquelas paragens? Alienação! responderão os pseudo-racionais. Ignorância! responderão os pseudo-omniscientes. Sub- desenvolvimento! responderão os que se assumem como as primícias da nova sociedade. Turismo! responderão os que desconhecem a sua terra, mas vão apreciar umas quaisquer Berlengas situadas no outro lado do planeta.

O curioso é que perante tal multidão ficamos pensativos, cheios de perguntas, com a sensação de quem se quer encontrar e o pressentimento de que algo nos atrai e nos interpela. Ser seduzido pelo invisível e caminhar sentindo a terra que pisamos é uma experiência que nos orienta lá para as bandas do Sol Nascente que já ilumina o nosso hoje, mas que anuncia o nosso amanhã.

Algo de inteiramente novo e diferente aconteceu e acontece naquela charneca que duma maneira ou outra nos seduz e nos faz erguer o rosto para o alto onde até o sol parece dançar a dança da luz.

Senhora da charneca a nossa terra orgulha-se por teres deixado no meio de nós um sinal da tua presença amável, própria da presença duma boa mãe. É uma terra magra, cheia de pedras e abundante de espinhos. Transformá-la em terra fértil que dê pão para todos é tarefa árdua e que vai deixando as suas vítimas. Necessitamos da Tua ternura que vá cicatrizando as nossas muitas e por vezes profundas feridas.


domingo, 6 de maio de 2012

O fundamental


 
Impressionou-me neste fim de semana a síntese que o Apóstolo João, já na fase mais vetusta da sua vida e certamente resultado duma profunda e analítica reflexão, faz no capº 3º da sua 1ªcarta aos cristãos seus contemporâneos acerca do que considera como fundamental. João com toda a simplicidade e duma forma fácil de compreender explica que existe um mandamento fundamental: "acreditarmos no nome de Jesus Cristo, como Filho de Deus, e amarmo-nos uns aos outros, como Ele nos mandou".

Ao longo da história temo-nos empenhado, na senda do que era típico do judaísmo contemporâneo de Jesus, em construir um sistema normativo que nos tem feito prisioneiros dum emaranhado de leis e preceitos, interpretados por especialistas devido à menoridade instalada, explorada e cultivada no comum dos fiéis. Fomos sendo assumidos como ignorantes, surgindo assim os estatutariamente leigos, o mesmo é dizer os oficialmente ignorantes. É certo que hesistiram raras e honradas excepções, mas todas elas foram constituídas em exemplos para lenitivo do peso da ignorância e das incapacidades que se abate sobre o "comum".

É para mim extremamente gratificante e libertador ouvir pela voz autorizada do Apóstolo João afirmar com toda a simplicidade que a proposta que me é feita é que reconheça Jesus Ressuscitado, a Ele adira como Caminho,Verdade e Vida, O aclame como Libertador da tragédia da minha mortalidade e que assuma uma forma nobre de me relacionar com todos os demais, isto é, amar a todos pois todos são meus iguais em dignidade. Obrigado João Apóstolo!